Excerto do livro “Parallax”, pelo arquiteto Steven Holl.
Trecho do capítulo Criss-Crossing
Tradução por Erick Ribeiro e Lucas Kin
Que um edifício seja estático é a exceção: nosso prazer provém de andar por aí para assim fazer com que o prédio oscile, enquanto nós aproveitamos todas as combinações de seus elementos. Enquanto ele oscila, as colunas giram, os fundos recuam, galerias planam: mil visões escapam.”
–Paul Valéry, O Método de Leonardo
O espaço é o meio essencial da arquitetura. O Espaço é simultaneamente muitas coisas— os vazios na arquitetura, o espaço do entorno da arquitetura, o vasto espaço da paisagem e da cidade, os espaços intergaláticos do universo. O espaço é tanto algo intrínseco quanto relacional.
Paralaxe — a mudança na disposição de superfícies que define o espaço como o resultado da mudança de posição do observador — é transformada quando os eixos de movimento deixam a dimensão horizontal. Movimentos verticais ou oblíquos pelo espaço urbano multiplicam nossas experiências. A definição espacial é ditada por ângulos de percepção. A noção histórica de perspectiva como volumes enclausurados com origem no espaço horizontal, hoje em dia perde espaço para a dimensão vertical. A experiência arquitetônica foi removida de seu nicho histórico. Lapsos verticais e oblíquos são a chave para novas percepções espaciais.
O movimento do corpo enquanto ele cruza através de perspectivas sobrepostas formadas enquanto inseridas no espaço, é a conexão elementar entre nós mesmos e a arquitetura. O “horizonte aparente” é um fator determinante na interpretação do espaço por um corpo em movimento; porém, a metrópole moderna carece desse horizonte. Experiências seriadas do espaço em paralaxe, com seu fluxo clarecedor, só são efetuadas na percepção pessoal. Não há medida mais importante da força e potencial da arquitetura. Se deixarmos fotos de revistas ou imagens em telas substituírem a experiência, nossa habilidade de perceber arquitetura irá diminuir de forma tão drástica que será impossível compreendê-la. Nossa faculdade de julgamento é incompleta sem essa experiência de cruzar através dos espaços. O requebre e contorção do corpo engajando em uma perspectiva uma vez longa, uma vez curta, um movimento para cima e para baixo, um ritmo aberto-e-fechado ou claro-e-escuro das geometrias — isso está no centro da composição espacial da arquitetura.
paralaxe removeu a astronomia do sistema solar


As quinas, perfis, e superfícies das estruturas que definem os espaços urbanos (redefinidos em paralaxe) são reveladas na percepção dinâmica e na luz. A mera geometria ou ideia de “fachada” é bem limitante. A experiência do espaço urbano gerado pela ligeira rotação de paredes planas individuais é inseparável da parábola solar tangenciando seus limites. O movimento da luz do sol exerce forças associadas na definição espacial, cativando o corpo de um prédio estacionário. A luz prateada do sol, a sombra das árvores, e a superfície brilhante do concreto interagem em um jogo de sombras com a passagem do corpo por eles.
Os espaços da cidade de noite nos acolhem com elipses de luz projetada, fachadas envidraçadas que brilham, e transformações induzidas pela névoa e pela chuva. Um denso complexo de quadras, cortado por uma rua cânion de dia, é redefinida de noite como um prisma reluzente de luzes num chiaroscuro de sombras projetadas. Há efeitos chocantes dos vapores da fumaça na noite, quando nuvens de luz branca cercam o topo de torres iluminadas ou quando tiras de gaze dourada radiam no céu da noite. As definições espaciais da cidade intercalam numa teia de movimento, paralaxe e luz.
Brincamos maravilhados com nossos olhos abertos, nossas pernas movidas, nossos braços e tronco engrenados. O fenômeno do espaço indescritível refere-se à máxima intensidade e à qualidade da execução e da proporção— uma experiência se torna radiante. Dimensões sozinhas não criam espaço; ao contrário, o espaço é uma qualidade correspondente à percepção.

